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Gazeta do Povo: HABITAÇÃO / Sonho da casa própria desmorona

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Foto de Henry Milleo / Gazeta do Povo

Foto de Henry Milleo / Gazeta do Povo

Famílias que adquiriram moradias populares por meio de programas de habitação encontram problemas estruturais nas residências

Fonte: Gazeta do Povo, por Anderson Gonçalves, colaborou Dilvo Rodrigues, especial para a Gazeta do Povo

Uma porta que não fecha, o banheiro que alaga, vazamentos espalhados pela rede hidráulica, rachaduras que começam a surgir nas paredes ou no piso. De repente, o sonho da casa própria já não é mais tão belo quanto se mostrava quando o proprietário recebeu as chaves em mãos. Esse despertar frustrante tem feito parte da vida de muitas famílias que adquiriram casas populares recentemente no Paraná. Pouco tempo depois de chegarem às novas moradias, seus habitantes se depararam com uma série de problemas estruturais, alguns solucionados por conta própria, outros ainda à espera de algum tipo de intervenção.

No início de abril, dezenas de famílias se mudaram para o Conjunto Moradias Boa Esperança 1, no bairro Tatuquara, em Curitiba. Com mais de 200 unidades, o empreendimento da Companhia de Habitação Popular de Curitiba (Cohab) recebeu investimentos de R$ 8 milhões do governo federal para abrigar famílias removidas de áreas de risco e ocupações irregulares. Uma delas é a da dona de casa Jusselei dos Santos Corrêa, que encontrou o imóvel com rachaduras e problemas no banheiro. “Quando alguém vai tomar banho, ao invés de ir para o ralo, a água escorre para a sala”, relata.

Na residência de Paulo de Melo, é impossível trancar as portas dos quartos porque elas vieram sem as chaves. Já os bocais para lâmpadas tiveram de ser providenciados pelo próprio morador. A situação mais grave, porém, é na casa ao lado, onde mora sua mãe. Em função do desnível, a porta do banheiro não fecha. “Como eles entregam uma casa desse jeito?”, questiona indignado.

Situações que se repetem no conjunto Moradias Jandaia, no bairro Ganchinho, também construído pela Cohab. “Aqui se você tentar colocar um prego na parede, ela cai.”, ironiza a vendedora Elisangela Gonçalves, que mora no imóvel há cerca de um ano. A estrutura de uma das portas está totalmente descolada da parede e parte do forro do teto caiu. No banheiro, foi necessário furar a parede para sustentar a caixa de descarga com um arame. As portas não fecham e a estrutura de metal de uma delas está danificada.

A vizinha de frente, Vera Tomás de Oliveira, sofre com a descarga do banheiro. “A água vaza, molha o vaso e o chão. Isso quando a descarga funciona”, conta. No imóvel dela também há problemas com portas desniveladas e rachaduras. Já a moradia da servente Sueli Ferreira foi construída em nível mais baixo em relação à rua. Assim, qualquer chuva que ameace cair já é motivo de preocupação, já que facilmente o terreno se transforma em uma verdadeira caixa d’água.

Inaugurado em dezembro do ano passado, o Residencial Jardim Europa, em Fazenda Rio Grande, na Região Metropolitana de Curitiba, também já coleciona reclamações de moradores. Recentemente, uma rachadura apareceu na fachada da casa de Natália Pinheiro da Silva, que já teme pelo comprometimento da porta. “Um pedaço da estrutura da porta já está se soltando. Meu medo é que daqui a pouco eu não consiga mais fechá-la.”

Já Donaia Aparecida da Costa conta ter recebido o imóvel com buracos no piso e defeitos nos cantos das paredes. Mas a preocupação maior está nos fundos, onde a ausência de um muro de arrimo faz com que parte do terreno esteja cedendo. “A cada chuva cede mais um pouco, logo chega na minha casa”, diz a moradora, apontando para o barranco a poucos metros da sua parede.

Outro lado

Cohab, Cohapar e Caixa Econômica asseguram reparos nas residencias

Por meio de suas assessorias de comunicação, tanto a Companhia de Habitação Popular de Curitiba (Cohab) quanto a Companhia de Habitação do Paraná (Cohapar) garantiram que estão à disposição dos moradores para receber as queixas e corrigir possíveis defeitos nas residências dos conjuntos habitacionais. Responsável pelo conjunto Moradias Jandaia, a Cohab informou que os proprietários devem formalizar suas reclamações na companhia. Ainda de acordo com a assessoria do órgão, uma equipe composta por engenheiros está fazendo um levantamento das condições dos imóveis já entregues para, posteriormente, promover os reparos necessários.

Já as obras do Boa Esperança 1 e do Jardim Europa foram apontadas pela Cohab como de responsabilidade da Caixa Econômica Federal, visto que sua execução se deu através do programa Minha Casa, Minha Vida. A assessoria de comunicação da Caixa informou que “a construtora responsável pela finalização do empreendimento já está realizando as adequações e reparos necessários”.

A assessoria da Cohapar garantiu que não foi registrada nenhuma reclamação referente ao conjunto Santa Clara, em Ponta Grossa. De acordo com a companhia, porém, um mestre de obras permanece no local à disposição dos moradores para verificar eventuais problemas nas construções. Os mutuários podem ainda procurar os escritórios da Cohapar ou ligar para o telefone 0800645005. A companhia promete disponibilizar um engenheiro para vistoriar o imóvel e, se comprovado que o problema ocorreu na construção, serão feitos os reparos necessários.

Moradores são obrigados a “dar um jeito”

No conjunto habitacional Santa Clara, em Ponta Grossa, não é raro encontrar moradores “dando um jeito” nas casas. Com 500 unidades, o residencial feito pela Companhia de Habitação do Paraná (Cohapar) começou a ser habitado em 2007, quando foram entregues 130 unidades. As últimas 370 moradias só foram entregues em dezembro de 2011 e março de 2012. Além da demora para começar a viver na casa própria, muitos moradores são obrigados a conviver com problemas hidráulicos e erosões.

Desde que chegou à casa nova, há três meses, a vendedora autônoma Marília Araújo coleciona uma série de modificações no imóvel que ela e o marido têm bancado. “Assim que entramos aqui já constatamos diversos vazamentos – na pia, na descarga e no encanamento. Chegamos a pagar R$ 115 de conta de água por causa disso. Um desses vazamentos chegou a abrir uma rachadura bem na nossa fachada. A gente mesmo resolveu o problema”, relata. Marília afirma que eles só conseguem fazer esses ajustes porque o marido dela é pedreiro. “Se tivéssemos que contratar mão de obra, não ia dar certo.”

A rua onde ela mora é inclinada e, por isso, os terrenos precisaram ser planificados. Como o morador é o responsável pela construção dos muros – e muitos ainda não fizeram ou sequer se mudaram para as casas novas – vários barrancos entre as casas estão sofrendo erosão. “Um dos meus vizinhos de fundo chegou a erguer um muro entre a casa dele e a de baixo. Mas a força da água foi tão grande que, há alguns dias, o muro veio abaixo”, relata. Um pedreiro está refazendo e reforçando o muro, um dos poucos que já estão em pé entre as casas mais novas.

O sonho da casa própria também tem sido, por enquanto, um pesadelo para Júnior Ribeiro da Costa. O comerciante, que recebeu a casa em dezembro passado, conta que as enxurradas invadiram o imóvel diversas vezes. “Eu mesmo fiz uma pequena barreira de concreto entre a minha casa e a de cima. Mas, mesmo assim, a água acaba entrando.” Ele também afirma que, quando chove, o esgoto verte e corre a céu aberto em algumas ruas do conjunto. “Não há quem aguente o cheiro.”

Derek Kubaski, especial para a Gazeta do Povo

Vistoria

Fiscalização deficiente agrava problemas

O uso de materiais de baixa qualidade, aliado à falta de fiscalização por parte do poder público, são os principais fatores desencadeadores dos problemas detectados nos conjuntos habitacionais do estado. Para o vice-presidente administrativo adjunto do Instituto de Engenharia do Paraná, Celso Pasqual, os proprietários devem ficar atentos no momento da vistoria técnica, realizada antes da entrega do imóvel.

“Não se pode negligenciar a importância da vistoria. O dono do imóvel deve acompanhá-la sem nenhuma pressa. Se os defeitos não forem verificados ali, fica mais difícil provar que são vícios de construção e não de uso”, alerta Pasqual. O engenheiro lembra ainda que, caso seja comprovado que a razão do problema é material de baixa qualidade, é possível responsabilizar o fornecedor.

Para Pasqual, os órgãos públicos deixam a desejar no que se refere à fiscalização de obras. “O Brasil tem uma deficiência enorme nesse quesito. Temos que endurecer a fiscalização. Um fiscal eficiente jamais deixará passar defeitos aparentes.”

No Procon, quase não existem reclamações sobre moradias populares, o que não impede que seus proprietários recorram ao órgão. “Eles devem ficar atentos à qualidade da obra e fazer a reclamação o mais rápido possível. Não é apenas uma questão financeira, é a sua vida que pode estar em risco”, alerta a coordenadora do órgão, Cláudia Silvano. (AG)


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